Cruella: O que funcionou e o que não rolou

Releituras sempre têm acertos e erros. Entenda

Em 2021 se completaram 60 anos do lançamento de 101 Dálmatas, uma das animações de maior sucesso dos estúdios Disney. E uma das últimas a contar com Walt Disney na produção. Mas o fato de Cruella, o prequel em live-action que conta a história da vilã, ser lançado este ano foi apenas coincidência. Já que a ideia inicial era de que o filme estreasse em 23 de dezembro de 2020.

++ Leia também: cinco curiosidades sobre Cruella

Os motivos pelos quais decidiram fazer um filme contando o passado de Cruella DeVil podem ser vários. Um deles é simplesmente que a Disney vem conseguindo bom retorno dos remakes em live-action de seus clássicos, mas o de 101 Dálmatas propriamente dito já foi feito em 1996. Outro é que filmes explorando o passado de vilões estão em voga, vide Malévola e Coringa. Além de que o visual irreverente da personagem criada por Dodie Smith (autora do livro que inspirou a animação) e imortalizado pelo animador Marc Davis é um ícone à parte. E a vilã ganhou ainda mais destaque após ser interpretada por Glenn Close no filme de 1996 e sequência de 2001.

A grande questão era: Como explorar o passado da vilã mais ardilosa e fria da Disney e ainda ser um filme Disney? Se você assistiu Once Upon a Time deve se lembrar que a série apresentou sua própria versão de origem da vilã na 4ª temporada. Interpretada por Victoria Smurfit, a personagem foi mostrada como uma psicopata mesmo. Que matou a própria mãe e os cães dela, com os quais fez um casaco. Mas o filme estrelado por Emma Stone não poderia contar essa história e ter classificação indicativa 12 anos. Então foram feitas muitas mudanças. Já temos um review de Cruella aqui no Popoca, mas vamos ver um pouco do que funcionou e do que não funcionou.

Alerta de Spoiler: Contém algumas revelações do enredo a partir daqui.

 Repaginação total da personagem

Assim como Malévola, Cruella foi repensada de uma forma em que não fosse puramente má. Ela tem sim uma personalidade difícil, mas longe de ser uma psicopata. Ainda ganhou uma infância simples, uma vida de injustiças sociais e uma juventude aplicando golpes para sobreviver ao lado de seus amigos Jasper (Joel Fry) e Horace (Paul Walter Hauser). Somam-se a isso a morte prematura da mãe que a criou com a descoberta da rejeição e total indiferença de sua mãe biológica. Esses fatores moldaram o caráter raivoso e subversivo de uma personagem que escolheu o nome Cruella DeVil que até podemos gostar. Diferente da socialite nascida em berço de ouro que nasceu com esse nome da história original. Mas talvez a mudança mais notável seja a de que ela deixou de ser uma amante de peles para virar eco friendly! Chegando a criar roupas com materiais reciclados. Vamos combinar que peles não estão com nada, né? Ah sim, e a nova Cruella adora cachorros.

Ambientação

Se a ideia era uma repaginação total, então a trama não precisava estar presa à época da animação (década de 1950) e nem à época de live-action (década de 1990) de 101 Dálmatas. E que época seria mais perfeita para ambientar uma revolução da moda causada por uma jovem subversiva que os anos 1970? Ah, o movimento punk rock! A era das revoluções sociais! Poder para o povo! Sim, a Londres dos anos 1970 se mostrou o cenário perfeito para a nova Cruella!

Χ Roger advogado

Que palhaçada foi essa? Roger é um espírito livre, um artista em tempo integral. Um compositor na animação e um criador de games no live-action, jamais um advogado de uma empresa sanguessuga que só toca piano nas horas vagas. Tudo bem, repaginação total. E talvez tenha sido a forma que os roteiristas encontraram de inseri-lo na trama e que ele ainda odiasse Cruella. Mas se ela foi responsável por Roger (Kayvan Novak) perder um emprego do qual ele não gostava e ainda lhe deu seu melhor amigo (mais sobre isso depois), me parece um ódio despropositado. Mas como não foi um defeito tão grave, podemos relevar.

Trilha sonora

Além de uma ótima trilha orquestrada composta por Nicholas Britell, o filme conta com icônicas canções das décadas de 1960 e 1970. Principalmente rock. O que torna o conjunto um grande deleite para os ouvidos. Impossível não cantar junto quando começa a tocar Queen, Supertramp, Blondie, Nina Simone, David Bowie, The Clash e tantas outras bandas maravilhosas que estão presentes. Não sei porquê não usaram a versão original de Come Together dos Beatles, embora a versão de Ike & Tina Turner que foi usada seja tão boa quanto. E o que dizer de Sympathy For The Devil dos Rolling Stones tocando ao fim? De arrepiar! E durante os créditos finais, em vez de simplesmente termos uma regravação da clássica Cruella De Vil composta por Bill Lee, tivemos uma canção original. Trata-se de Call Me Cruella, da maravilhosa banda Florence + The Machine. Simplesmente impecável.

Χ Crescimento do Buddy

Certo, alguns cães mudam bastante de aparência quando crescem. Mas o caso do pet de Cruella é absurdamente bizarro. O Buddy filhote e o Buddy adulto são claramente cães distintos. Um filhote de pelagem curta jamais se tornará um cão peludo. O filme ainda conta com outros absurdos relacionados a cães, mas esse é certamente um dos piores e que mais chamam a atenção. Porém, ainda merece pontos por Cruella adotar um vira-lata. Vira-latas são amor!

Representatividade

Uma coisa que permaneceu da história original é que Cruella e Anita (Kirby Howell-Baptiste) são amigas de infância. E foi muito bom ver Anita ser mostrada como uma mulher forte e independente (que já era no filme de 1996), uma jornalista que enfrenta o sistema, e com isso contribuiu com a revolução de Cruella. O fato de ser negra acabou não influenciando na história, nem mesmo para uma simples menção aos movimentos antirracistas que já ocorriam na época. Mas a escalação da atriz é um grande ponto para a representatividade, além de ótima escolha. E a inserção do personagem Artie (John McCrea), o estilista de visual andrógino foi uma ótima referência às questões de gênero que começaram a ser debatidas na época.

Χ Pongo e Perdita são irmãos

A cena pós-créditos mostra Roger e Anita recebendo um presente de Cruella, um filhote de dálmata cada um. Pongo e Perdita, respectivamente. Como já confirmaram a sequência de Cruella, alguns teorizam que o segundo filme mostrará a versão de Cruella dos acontecimentos de 101 Dálmatas (que precisarão de outra repaginada). Se isso realmente acontecer, implica em Pongo e Perdita tendo quinze filhotes. Mas aí se acende um alerta vermelho, pois não se deve fazer o cruzamento entre animais da mesma família. A prática, muito usada nas abomináveis “fábricas de filhotes”, pode resultar em graves danos a saúde dos filhotes. Como a Disney quer que seus filmes sejam politicamente corretos e só deem bons exemplos, espero que deem um jeito nisso.

Homenagem a The Fresh Prince of Bel-Air

Esse não é oficial, mas não podia deixar de mencionar. A verdade é que quando vi a Estella de 12 anos (Tipper Seifert-Cleveland) virar o casaco do uniforme do avesso, não pude deixar de lembrar de Will Smith em sua icônica série dos anos 1990. Mas até que seria uma boa referência. Afinal, tanto Will quanto a nova Cruella desafiam o sistema e querem deixar sua marca.

Cruella foi liberado para todos os assinantes do Disney+ em 16 de julho. O filme tem história escrita por Aline Brosh McKenna, Kelly Marcel e Steve Zissis. O roteiro é de Dana Fox e Tony McNamara, direção de Craig Gillespie, e Glenn Close entre os produtores-executivos.

E já que você chegou até aqui, ouça o nosso podcast sobre filmes de origem! Aperte o play:

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