Kurt Busiek

Conversamos com Kurt Busiek, autor de ‘Marvels’!

Em parceria com o Alexandre Inagaki (Pensar Enlouquece) e o Comic Pod, o POPOCA conversou com Kurt Busiek, autor de Marvels e Astrocity. A entrevista, feita por email foi traduzida por Carlos Carneiro e segue abaixo.

Com uma carreira marcada por trabalhos na Marvel e na DC, Busiek é uma lenda viva nos quadrinhos e conta com uma vida marca pela amizade com Scott McCloud e trabalhos com autores como Alex Ross. No papo, Busiek conta inclusive sobre as coincidências que levaram ao seu trabalho mais famoso…

POPOCA: Acredito que Marvels foi o quadrinho da minha geração. No Brasil foi tão impactante quanto Watchmen nos anos 80. Você poderia nos contar como foi a origem da série e o que trouxe pra você?

Kurt Busiek: Bondade sua dizer isso, obrigado.

Na verdade, Marvels aconteceu quase que por acidente. Foi uma série de eventos que seriam impossíveis de terem sidos combinados de propósito. Eu tinha contratado Alex (Ross) quando trabalhava para Marvel para fazer uma história curta no espaço, uma antologia de ficção científica que estava editando. A história não foi publicada (pelo menos não naquela época) porque a revista foi cancelada. Mas, quando Alex decidiu tentar novamente trabalhar em quadrinhos, eu era “o cara da Marvel” que ele conhecia, então ele veio até mim com um pacote de amostras fantástico e uma ideia que ele queria fazer. Era basicamente uma antologia de histórias pintadas sobre super-heróis.

Não estava trabalhando na equipe da Marvel naquele momento, e também não acreditava que seria possível vender uma história aberta de uma antologia de um novato. Porém, eu e ele começamos a conversar sobre de que jeito poderíamos transformar a ideia dele em algo que pudéssemos vender e comecei também a mostrar o trabalho dele para alguns editores que conhecia. Um desses editores o contratou para fazer um pequeno trabalho para Eclipse Comics, mas ela também o queria para algumas adaptações de Clive Barker e ele (Alex) não estava muito interessado. A Editora chegou a mandar algumas amostras de Alex para o próprio Barker na esperança dele o convencer a fazê-las. Só que Barker acabou enviando as amostras para Marc McLaurin na Marvel, que estava editando a série Hellraiser, de Barker.

Ele contratou Alex para fazer uma história de Hellraiser, mas como as amostras de Alex eram de personagens da Marvel, ele quis saber se elas eram parte de um projeto também, se era de algo que também pudesse vender. Então, Alex contou que ele e eu estávamos conversando sobre algo e Marcus nos convidou a apresentar o projeto. Esse foi o caminho que nos levou a Marvels. É difícil de planejar com antecedências uma série de eventos envolvendo Clive Barker!

De qualquer forma, Marvels foi o projeto que estabeleceu tanto o nome de Alex como o meu. Praticamente tudo que fizemos desde então, juntos ou separados, só existe por conta dele. Estou muito feliz que tantas pessoas tenham gostado dele e agradecido por todas portas que abriu.

POPOCA: Você e Alex Ross fizeram um trabalho incrível em Kirby: Genesys. O quão importante foi o trabalho de Jack Kirby em sua vida?

Kurt Busiek: Kirby foi extremamente importante para mim. Ele criou e co-criou tantos personagens que eu amava como um fã de quadrinhos e ainda amo trabalhar com eles. Tem algo em sua imaginação que simplesmente se tornava em personagens poderosos e cativantes. Mesmo antes de saber quem escrevia ou desenhava os quadrinhos, já reconhecia a força de Kirby. Quando comecei a ler quadrinhos regularmente havia duas séries mensais do Quarteto Fantástico. Uma era Quarteto Fantástico, escrita por Gerry Conway e Roy thomas; e normalmente desenhada por Rich Buckler. A outra era Marvel’s Greatest Comics, que relançava os clássicos do Quarteto Fantástico criados por (Stan) Lee e (Jack) Kirby.

Naquela época não sabia que eram relançamentos, apenas que era fã de Quarteto e as histórias em Marvel’s Greatest Comics eram melhores. Então fiquei imaginando como que eles sabiam como colocar as melhores histórias em uma delas. Será que se uma história do Quarteto Fantastico chegasse eles pensavam: “ Hum… não coloca essa aqui no Quarteto Fantastico não ela é muito boa, deixa ela pro Marvel’s Greatest Comics.

Como escritor sempre fui influenciado por Kirby e foi emocionante conhecer e conversar com ele. Então, quando a editora Dynamite nos pediu para fazer Genesis, foi impossível dizer não. A chance de trabalhar com as personagens de Kirby em sua forma mais pura, direto de seus próprios quadrinhos, desenhos e anotações, foi irresistível.

Fazer a série foi fantástico, estou feliz que (você) tenha gostado.

POPOCA: Nós somos um website brasileiro e você trabalhou com Jack Herbert, que é brasileiro, em Genesis. O que você pode contar para gente sobre ele ou sobre o Brasil?

Kurt Busiek: Nunca me encontrei com Jack Herbert, mas trabalhar com ele foi um prêmio. Sua arte foi ideal para Genesis – ela combinava tanto com os desenhos de (Jack) Kirby quanto com as interpretações de Alex e a quadrinização das páginas. Ele conseguiu equilibrar realismo e fantasia cósmica, além de desenhar lindamente. Fiquei feliz em vê-lo trabalhando na DC Comics também. Espero que ele seja bem sucedido como artista.

COMICPOD: O que você acha da situação comercial da indústria americana no momento? Em 2016, A DC aumentou suas vendas com a iniciativa Rebirth. Agora está tentando entrar em mercados diferentes como o Walmart. No entanto os números da Diamond Comics estão em baixa novamente. O que você acha que está acontecendo e o que poderia ser feito para aumentar as vendas novamente?

Kurt Busiek: Acredito que é muito difícil julgar a indústria de fora. Parece que quadrinhos estão ganhando mais dinheiro com coleções de livros, o que torna cada vez mais difícil manter uma série contínua como antes. Porém, quadrinhos ainda alcançam muitos leitores e as empresas estão lucrando. Estamos claramente em um período de ajuste e as editoras estão tentando descobrir novos meios. Se soubesse a melhor resposta, a usaria e ficaria rico.

Mas acredito que a resposta, se realmente existir, vai acontecer de diversas maneiras diferentes. Nós precisamos atrair leitores com um material que eles gostem, em um formato que eles comprem e fornecer variedade suficiente para que se tornem leitores regulares. Acho que isso vai acontecer com Graphic Novels originais, quadrinhos digitais, coleções em livros etc. Mas o que quer que funcione com essas estratégias de distribuição, provavelmente não será o mesmo que funcionava com as bancas de revista no passado.

Então imagino que temos que continuar experimentando, ver se há mercado para diferentes tipos de quadrinhos. Quadrinhos direcionados para crianças, como GNs de Raina Telgemeier, são muito bem-sucedidos. Quadrinhos sobre crimes com os feitos por Ed Brubaker e Sean Phillips estão se saindo bem. Parece haver interesse em fantasia e terror, além das grandes aventuras de super-heróis, que ainda são populares.

Vou apenas continuar escrevendo boas histórias que me agradam e torcer para que os leitores queiram lê-las.

COMICPOD: Anos atrás você escreveu Superman: Identidade Secreta. Recentemente tivemos Batman: Criatura da noite, com uma proposta parecida. Você tem ideias similares para outros personagens da DC?

KB: Não sei. Tenho uma “meia-ideia” para um projeto com a Mulher-Maravilha mas não tenho ele todo. Talvez nunca tenha.

De qualquer forma, o fato de uma ideia ter funcionado para um ou dois personagens, não significa que funcionará para todos. Tenho muitas ideias para personagens da DC que adoraria realizar um dia. Flash, OMAC, O Demônio, Legião de Super-Heróis, Homens Metálicos e outros. Mas cada um deles tem seu jeito próprio, e prefiro trabalhar em projetos que foquem no que é melhor para cada personagem do que seguir algo padronizado.

O que fez Identidade Secreta funcionar foi o fato de ser diferente, e não mais do mesmo. Criatura da Noite deu certo mas gostaria de fazer outras coisas que sejam diferentes, e não continuar repetindo a mesma fórmula.

Alexandre Inagaki: Você já pensou em fazer algo no século XXI com seu amigo de infância, Scott McCloud?

KB: Claro que já conversamos sobre isso. Por enquanto, tempo, saúde, e outras coisas têm ficado no caminho. Nós dois costumamos estar bem ocupados. Espero que a gente consiga um dia.

Inagaki: Você poderia contar como foi para vocês dois crescerem e se tornarem grandes nomes nos quadrinhos? Imagino que seja como ser fã de basquete e se tornar um Jordan, por exemplo.

KB: Na verdade, eu não tenho muita base para comparação. Para mim é como a vida é. Mas acho que nenhum de nós dois teria entrado para o mundo dos quadrinhos sem ter o outro para ajudar a entendê-lo e se interessar por ele. No caso de Scott, ele literalmente nunca havia lido nada em quadrinhos até eu ter emprestado para ele uma série quase completa dos X-Men originais e encher a paciência dele para lê-la. Havia começado a ler quadrinhos e queria alguém para conversar sobre o assunto.

Então, se não tivesse insistido para que Scott começasse a ler quadrinhos, ele teria feito algo diferente na vida e jamais teria pensado sobre eles. No meu lado, comecei a entender como escrever quadrinhos porque eu e Scott fizemos alguns juntos. Sem ter feito isso, sem ter discutido idéias e criado histórias juntos e não sei se jamais teria entendido o processo. Eu provavelmente teria continuado a ler quadrinhos, mas não teria desenvolvido a habilidade e a ambição de escrevê-los.

Nós influenciamos um ao outro e nós dois começamos a trabalhar com quadrinhos após a faculdade e passamos muito tempo conversando sobre as coisas. Ele queria ser “de fora” da indústria, fazer quadrinhos próprios sem serem controlados pelas editoras. Eu queria ser “de dentro”, escrever para personagens que amava. E ainda assim nós conversávamos muito e discutíamos sobre coisas e fizemos o que fizemos. Então, em 1994, Desvendando Os Quadrinhos (de Scott Mcloud) e Marvels foram lançados e ganharam um monte de prêmios. É como se Deus estivesse nos acompanhando e dizendo: “Vocês dois estão certos. Agora calem a boca!”

Tem sido divertido. Este ano serei um convidado especial na Comic Com de San Diego, e Scott vai me entrevistar para um painel e nós vamos conversas sobre todas essas coisas. Estou ansioso.

POPOCA: Hoje em dia temos filmes baseados em quadrinhos como nunca aconteceu antes. O que você acha sobre o universo Marvel nos cinemas?

KB: Tenho gostado bastante e fiquei maravilhado com a maneira que introduziram a ideia de histórias conectadas dividindo um mesmo universo e com o jeito que fizeram funcionar para filmes. Nunca imaginei que fosse possível, mas fizeram um trabalho fantástico. Estou na expectativa para saber o que vem depois.

POPOCA: Qual foi o filme de super-heroi que mais gostou de assistir?

KB: Meus três favoritos eram Os Incríveis (2006), o primeiro filme dos Vingadores (2012) e o primeiro Espetacular Homem-Aranha (2012). Mas Homem-Aranha: No Aranhaverso foi maravilhoso também. Não saberia escolher um favorito.

Mas continuarei assistindo a todos!

(Traduziu Carlos Carneiro)

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