Ser Ou Não Ser normal?

Disponibilizada no Brasil antes do boom dos chamados doramas no país, série aborda saúde mental

Em 2020, estreou a série coreana Tudo bem não ser normal. Disponibilizada no Brasil antes do boom dos chamados doramas no país, a série se mostra bastante instigante para pensar a saúde mental e possíveis caminhos para a superação de diferentes tipos de transtornos. Na série, somos apresentados a Moon-Young, uma jovem escritora de livros infantis que sofre de transtorno de personalidade, apresentando um comportamento de distanciamento social e, em algumas situações, até mesmo violento.

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Outros dois personagens despontam n série também. Moon Gang-tae é o cuidador na clínica psiquiátrica em que o pai de Moon-Young está internado. Par romântico de Moon-Young, ao longo da narrativa o espectador é apresentado a sua vida sofrida e como isso o impacta.

Faz parte do trio de protagonistas também Moon Sang Tae, o irmão autista de Gang-tae. Sang Tae carrega o trauma de ter visto o assassinato da própria mãe, um mistério policial que constitui uma das linhas da narrativa da série e que, de alguma forma, se cruza com Moon-Young.

Uma das razões do sucesso da série passou pelas animações que são inseridas ao longo dos episódios. Parte deles são adaptações dos livros fictícios de Moon-Young, que, inclusive, foram publicados em formato impresso na Coreia do Sul e traduzidos no Brasil.

Os livros, bem como as animações exibidas na série, mostram o universo sombrio dentro do qual vive Moon-Young. Embora sejam livros infantis, são obras carregadas de melancolia e sofrimento e com ilustrações que, em muitos casos, são um tanto quanto sombrias.

Em grande medida, o que conduz a narrativa é a alusão à dos livros, como uma espécie de adaptação das obras literárias para a história exibida na tela. E isso revela muito do cenário sombrio em que viveu durante toda sua Moon-Young. O Cão Feliz, a Criança Zumbi e outros personagens dos livros fictícios terminam por ser metáforas dos próprios personagens da série.

No começo da série, conhecemos Moon-Young como uma pessoa violenta e um tanto quanto cruel. Aos poucos, são apresentados os acontecimentos que moldaram sua personalidade e legaram à sua subjetividade sofrimento, abandono e medo. Para Moon-Young, a superação de seus traumas passa justamente por tentar não odiar o mundo e as pessoas que a cercam e se aproximar de pessoas que possam amá-la. Mas isso passa também por essas pessoas conhecerem e aceitarem a “floresta sombria” dentro da qual sua personalidade foi moldada.

Entre algumas cenas que vão do engraçado à tristeza, da alegria ao sofrimento, vamos conhecendo os sofrimentos de Moon-Young e entendendo as razões de sua raiva em relação ao mundo. E, mais do que isso, que não odeia pessoas, como pode transparecer às vezes, mas que teme deixá-las entrar e levar ainda mais sofrimento para seu ser já tão traumatizado.

No final das contas, ao longo da série, mesmo diante de todos os riscos de sofrimento, Moon-Young escolhe encarar a realidade a que foi submetida e aceitar que outras pessoas possam ajudá-la a enfrentar esse mundo. Em uma cena bastante pesada, metaforicamente Moon-Young deixa a pessoa que agora conhece seus medos atravessar a porta para entrar em seu mundo sombrio.

No final das contas, sabemos, como Moon-Young, que não há cura para seus transtornos e traumas, mas a forma como escolhe encarar a crueldade da realidade e os sofrimentos a que foi submetida. Em sua vida, uma sombra nunca deixará de estar presente, mas isso não precisa definir Moon-Young nem servir para afastá-la dos outros que a cercam. Moon-Young deve, sem medo, escolher agir no mundo e viver a vida que seus medos e sofrimentos moldaram.

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