Lucifer: No fim das contas, é tudo sobre redenção e autoconhecimento

Alerta de spoilers

Menos de quatro meses após a temporada 5B, chegamos à reta final de Lucifer. Com apenas 10 episódios, a 6ª temporada estreou na Netflix em 10 de setembro despertando sentimentos mistos. E não sei como meus sentimentos me conduzirão até o fim do texto.

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Alerta de spoiler: Só continue a leitura se já tiver concluído a 6ª temporada de Lucifer.

Algumas coisas eram óbvias. Não seria fácil para Chloe (Lauren German) deixar a polícia da mesma forma que não seria fácil para Lucifer (Tom Ellis) assumir o trono da Cidade de Prata (vulgo Céu). Isso foi constatado logo no início, com o casal postergando por meses a partida e ela querendo resolver o assassinato do qual ambos foram testemunhas. Mas o que poderia ser apenas relutância em deixar a zona de conforto ganhou novas nuances com a descoberta de que uma anjo (ou seria anja mesmo?) chamada Rory (Brianna Hildebrand) queria matar o ex-Diabo/Futuro Deus.

Porém, a personagem que parecia ser a nova antagonista da série se revelou a filha de Chloe e Lucifer que veio do futuro com sede de vingança, querendo matar o pai por anos de abandono. Chegando a mentir para Dan (Kevin Alejandro) e transformá-lo em fantasma no caminho. Acontece que a inserção de Rory e da viagem no tempo foi um efeito colateral da renovação surpresa, quando a Netflix decidiu que a série terminaria na 6ª e não mais na 5ª temporada. Tanto Joe Henderson quanto Ildy Modrovich, os showrunners, disseram que a ideia do final sempre esteve lá. O que mudou foi a trajetória para chegar até ele.

Então não, a última temporada não foi um grande tributo a Dark e muito menos a De Volta Para o Futuro. Embora referências possam ter existido. Os roteiristas não podiam se distrair do fato de que a história não é sobre viagens no tempo, era apenas um meio para um fim. E apesar de no início (e até agora, na verdade) algumas decisões parecerem um pouco forçadas, a verdade é que o conceito de loop temporal fechado casa com o velho debate destino X livre arbítrio. Que sempre foi um dos principais conceitos da trama.

A filha do futuro também serviu para continuar a abordagem de dad issues, tão famosos na série. Ao descobrir sobre o sofrimento de Rory, tanto Lucifer quanto Chloe quiseram fazer de tudo para evitá-lo. Ele, querendo descobrir a razão de seu desaparecimento e anulá-la. Ela, se julgando uma péssima mãe e querendo descobrir o que fez de errado. No fim das contas, só fizeram o que a filha pediu. É natural que os pais não queiram que seus filhos sofram, mas o sofrimento é inevitável. A questão é como você irá lidar com eles. E os três precisavam passar por aquelas situações para descobrirem suas vocações.

E nem Rory, nem ninguém foi o grande vilão da temporada. A equipe criativa cumpriu o desafio de construir uma trama concisa e ágil sem a presença de um antagonista em tempo integral. Houve párias ocasionais, como o Detetive Reiben (Brian Oblak) que reencontrou Amenadiel (D.B. Woodside) no seu primeiro dia como oficial no episódio 6×06 (A Lot Dirtier Than That). Reiben já tinha aparecido no 4×08 (Super Bad Boyfriend), quando era um oficial que chocou Amenadiel por seu racismo. O retorno do personagem e a inserção da Oficial Sonja Harris (Merrin Dungey) serviram para mostrar ao querido anjo, e até Chloe, que o sistema é falho. O esperado episódio sobre o movimento Black Lives Matter foi triste, mas intenso e contribuiu para que os personagens em questão encontrassem sua vocação em transformar o mundo num lugar melhor.

Outro pária foi Adam (Scott MacArthur), que apareceu para melar o casamento de Maze (Lesley-Ann Brandt) e Eve (Inbar Lavi). Não passou de um plano de autossabotagem de Maze, que mais uma vez se julgou indigna do amor de Eve. Mas tudo está bem quando termina bem, e até o mala do Adam resolveu se tornar uma pessoa melhor com a ajuda de Linda (Rachael Harris). O fato é que a maioria dos desafios veio das inseguranças dos próprios personagens. Como Ella (Aimee Garcia) insegura para se abrir a possibilidade de romance com Carol (Scott Porter), ao mesmo tempo em que (finalmente) juntava as peças sobres os celestiais. Dan tentando descobrir o que causava a culpa que o impedia de ir para o céu. Até Linda, que não via mais desafios em cuidar de pessoas normais. E chegou a escrever um livro sobre Lucifer, apropriadamente intitulado como Sympathy for the Devil, o mesmo nome da famosa canção dos Rolling Stones. Só eu gostaria de ler esse livro?

Enfim, a temporada que foi cheia de referências, dos cartoons de Hanna-Barbera a Avatar: A Lenda de Aang, teve como maior tema seus próprios personagens. Mesmo Chloe, sempre tão centrada, precisou lutar contra fome de poder que o colar de Amenadiel lhe despertou. Como já dizia Tio Ben: Com grandes poderes vêm grandes responsabilidades. Apesar das falhas (como uma fucking anjo poderosa como Rory foi pega por um reles humano?), acredito que a série teve um desfecho condizente com tudo que sempre pregou. Teve gostinho de novela das 6h? Teve, mas foi merecido.

Maze e Eve casadas e felizes como caçadoras de recompensas. Dan enfim se perdoando ao ouvir de Trixie (Scarlett Estevez) que foi um bom pai, e passando a eternidade feliz com Charlotte (Tricia Helfer). Ella comandando uma fundação que incentiva meninas e mulheres a seguirem carreiras científicas. Amenadiel se tornando o novo Deus, usando seu conhecimento dos humanos para guiá-los a serem melhores. Linda novamente feliz com seu trabalho e criando Charlie saudável e angelical. Chloe dedicada a usar seu cargo de detetive para reformar o sistema e sendo feliz com suas filhas. E Lucifer descobrindo sua vocação em ajudar as almas do Inferno a se perdoarem.

O “felizes para sempre” do casal Deckstar foi inusitado, mas condizente. Cada um tinha sua vocação e precisava segui-la. E o que são alguns anos separados para quem tem a eternidade? Sim, esse foi um verdadeiro final feliz. Produtores não descartam a possibilidade de futuramente fazer um filme ou spin-off, mas por enquanto a jornada termina aqui.

Nota: 8,5

Confira o trailer da temporada:

 

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