Hellraiser: revivendo o inferno

Filme é releitura de toda mitologia de Clive Barker

Em 2022, estreou um dos filmes de terror mais aguardados dos últimos anos, a refilmagem de Hellraiser. O filme é uma releitura completa não apenas da obra original, publicada em livro por Clive Barker, que também foi o diretor do primeiro filme. Trata-se de uma releitura da própria mitologia desenvolvida ao longo de cerca de quarenta anos em filmes, livros, quadrinhos e outros formatos. O novo filme atualiza temas anteriormente abordados e, também, traz perspectivas e preocupações contemporâneas.

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O novo filme apresenta como protagonista a jovem Riley McKendry (interpretada pela promissora Odessa A’zion), numa fase de sobriedade depois da recuperação por uso de drogas. Esse perfil contrasta com a protagonista da obra original, Kirsty, cujos problemas estão muito menos relacionados ao seu comportamento e mais à sua família desestruturada. Kirsty se aproxima mais da final girl típica dos filmes de terror da década de 1980, inclusive em seu comportamento pudico, muito diferente de Riley, cuja primeira aparição no novo filme se dá em uma cena de sexo.

Em determinado momento, Riley acaba se deparando com a famosa caixa do quebra-cabeça, cujas diferentes configurações expressam o próprio desenvolvimento da narrativa do filme. O desaparecimento e a busca pelo irmão, uma das vítimas da perigosa lâmina que a caixa possui, levado e possivelmente morto pelos cenobitas, é o que motiva a busca de Riley por entender o misterioso artefato. Nesse processo, outras pessoas – e até mesmo um dos cenobitas – acabam sendo vítimas em alguma das configurações da caixa.

O filme, a partir de seu segundo ato, se torna bastante investigativo, com Riley buscando informações que pudessem ajudá-la a entender as configurações da caixa e, com isso, descobrir o que houve com seu irmão. Poderia, assim, chegar à configuração de Lázaro, a quinta, que possibilitaria ressuscitar o seu irmão. Descobre-se, nesse processo, que um personagem apresentado nos primeiros minutos do filme era um fanático que atraía pessoas para serem vitimadas pelos cenobitas e, com isso, fazer avançar as configurações.

Depois fazer com que a caixa chegasse até sua última configuração, Leviatã, que permitiria escolher o presente associado a qualquer uma das configurações, Riley opta pela primeira configuração, o lamento, ou seja, por seguir vivendo com o luto pela morte do irmão e as consequências das escolhas que fez ao longo de todas as configurações da caixa, inclusive o sofrimento e as mortes que causou. Se nos filmes originais, especialmente o segundo, se viu literalmente o inferno, nesta nova produção o inferno se mostra no sofrimento subjetivo vivenciado por Riley.

Se no primeiro filme o principal conflito da protagonista passava pelo embate com a traiçoeira madrasta, a refilmagem coloca Riley em meio a muito mais conflitos – as drogas, o namorado criminoso, a instabilidade da relação com o irmão, as escolhas que faz, entre outras coisas.

O filme mostra uma jovem depressiva que tenta encontrar um caminho para tentar sobreviver em um mundo que só lhe traz sofrimentos, tendo de chegar à conclusão de que não há outra forma de viver que não seja encarando seus medos e fantasmas. Riley consegue seguir em frente, ao final do filme, apenas quando tem a clareza das consequências de seus atos, buscando, em certa medida, uma forma de redenção para seus pecados.

Estética e tecnicamente, o filme mostra-se uma excelente produção, além de ter um roteiro bem escrito, e com seus vários elementos bem amarrados. Os cenobitas, recriados em alguns aspectos de sua aparência, provocam todo o pavor da obra original. E, claro, ao apresentar uma líder mulher para os cenobitas, o novo filme resgata a primeira ideia expressa no livro que originou o filme.

Um elemento negativo do filme são as intepretações, que no geral são pouco consistentes. São exceção Odessa, que entrega uma protagonista brilhante, e a excelente Jamie Clayton, que teve o grande desafio de estar à altura de assumir o manto do icônico personagem tradicionalmente conhecido como “Pinhead”. Odessa e Jamie fazem excelentes intepretações.

O novo filme mostra estar à altura do legado não só da primeira produção, dirigida com poucos recursos pelo próprio Clive Barker, mas também da complexa e gigantesca mitologia produzida ao longo de décadas, deixando a expectativa de que posso ser feita uma continuação que traga novamente Odessa e Jamie.

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