Faltam adjetivos para ‘Nimona’

Animação da Netflix é exemplo em diversos aspectos.

Possivelmente a animação mais irreverente do catálogo da Netflix, Nimona chegou na plataforma em 30 de junho. Inspirada na HQ homônima de ND Stevenson (já resenhada aqui no Popoca pela Laura Cunha), a animação traz um mundo tecno medieval repleto de aventuras e significados que farão você se apaixonar.

Bal (Riz Ahmed) era o escolhido da Rainha Valerin (Lorraine Toussaint) para ser um grande cavaleiro, contrariando as crenças e costumes do reino. Mas bem no dia de sua nomeação ele foi vítima de uma armação que o colocou como assassino da rainha. A única disposta a ajudá-lo é Nimona (Chloë Grace Moretz), exceto que ela acredita que Bal é o vilão e quer destruir tudo. E ao lado dela, Bal luta para provar sua inocência ao mesmo tempo em que revê seus conceitos.

Como não tive oportunidade de ler a HQ original, me aterei em comentar o longa sem mencionar as diferenças entre as obras das quais apenas li a respeito. O que precisa ser dito de imediato é que Nimona é uma animação extremamente cativante e envolvente. Os personagens são incríveis, o humor é inteligente, o visual é bonito e divertido e tem as doses certas de ação e sensibilidade. Até esse mundo tecnológico com uma sociedade medieval, que a princípio pode causar estranheza, acaba sendo crível. Afinal, nosso mundo não é um pouco assim?

Animação Netflix, Nimona vale a pena para todas as idades
Animação Netflix, Nimona vale a pena para todas as idades especialmente pelo lado antipreconceito

O que certamente é um ponto alto do filme é tocar em pontos-chave do preconceito e da luta de minorias sem que a história ficasse didática. Há o suficiente ali para que as pessoas que sentem isso na pele todos os dias se identifiquem e se sintam acolhidos sem comprometer a trama. Pois temos como protagonistas um jovem de feições árabes que cresceu nas ruas, e por isso era visto como um pária, e uma garota metamorfa sem papas na língua. Além disso, Bal é gay e tem seu romance com Ambrosius (Eugene Lee Yang) comprometido quando passa a ser visto como criminoso. E as mudanças de forma de Nimona são uma alegoria para a transexualidade.

Em entrevista recente ao The New York Times, Stevenson revelou que criou Nimona anos antes de se assumir gay e trans. Ele disse que sempre amou metamorfos, e é possível perceber na personagem elementos da experiência trans como as perguntas desajeitadas de amigos. Por exemplo, há um momento em que Bal pergunta se “ela não pode ser normal por um segundo” e em outro se “não é mais fácil simplesmente ser uma garota”. (Como se fosse fácil ser uma garota.) Porém, qualquer um que sofra qualquer tipo de preconceito pode se identificar com Nimona quando ela diz que “as crianças são educadas para odiar e matar tudo que é diferente”.

A história por trás da produção também é bastante significativa. Ainda em 2015, mesmo ano da primeira publicação física de Nimona, a Fox Animation comprou os direitos de adaptação. Deixando-a a cargo da Blue Sky Studios. Depois da compra pela Disney a estreia foi adiada diversas vezes, até ser cancelada com o fechamento da Blue Sky em 2021. O que acarretou no desemprego de 450 pessoas. A Disney bem poderia ter assumido o projeto que já estava 75% completo, como fez com os spin offs de A Era do Gelo que era do mesmo estúdio.

Certamente a Disney não queria se comprometer com um título que abordasse temas LGBTQ+ de forma tão aberta. Tanto que em março de 2022, em meio às polêmicas envolvendo o estúdio e o CEO Bob Chapek com o projeto “Don’t Say Gay” da Florida, três ex-funcionários da Blue Sky afirmaram que o filme recebeu críticas negativas da liderança da Disney por causa do beijo entre Bal e Ambrosius. Se a Annapurna Pictures não tivesse adquirido Nimona em abril de 2022, o filme ainda não teria visto a luz do dia.

Como não precisaram começar do zero, a Annapurna e a Netflix mantiveram muito do que a Blue Sky já havia feito. Incluindo o elenco já contratado e os diretores Nick Bruno e Troy Quane. Este último também responsável pela história junto com Keith Bunin, Marc Haimes, Pamela Ribon, Robert L. Baird e Lloyd Taylor, os dois últimos também roteiristas. Nimona não é só o primeiro lançamento da divisão de animações da Annapurna, mas uma vitória para todos os nomes envolvidos.

Enfim, Nimona é tanto para aqueles que procuram um filme com temática LGBTQ+ quanto para os que só querem uma aventura divertida. Também é para qualquer um que precise sentir que não está só, pois como disse Quane: “Esta é uma história que é, no fundo, uma carta de amor para qualquer pessoa que já se sentiu diferente ou incompreendida.”

Nota: 10

Confira o trailer:

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