‘Estou pensando em acabar com tudo’ – A explicação

Estou pensando em acabar com tudo é um filme que poderia realmente se chamar Estou pensando que não entendi nada tamanha a dificuldade em compreender sua narrativa. Ainda que haja uma linearidade sobre um casal de namorados que atravessa uma longa estrada para chegar a casa dos pais de Jake (Jesse Lemons), a história tem pontos de virada que misturam viagens no tempo, sonho e referências pop. Em certo momento, dá até medo do filme dirigido e roteirizado por Charlie Kaufman.

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Se você ainda não assistiu Estou pensando em acabar com tudo pode conferir o filme antes de vir aqui ler spoilers. Logo abaixo da imagem, a gente traz nossa explicação para o filme e alguns links para te ajudar a compreender tudo.

Estou pensando em acabar com tudo é um filme que desafia as convenções para ser interpretado

No original, I’m Thinking of Ending Things traz pistas sobre seu sentido. O filme insinua trazer uma personagem principal interpretada pela atriz Jessie Buckley (Chernobyl): uma moça que pensa em terminar com seu namorado, interpretado por Leomons (Black Mirror) e aí temos a primeira pista. Sua personagem é creditada apenas como Young Woman (jovem mulher) assim como os pais de Jake são creditados somente como Pai (David Thewlis) e Mãe (Toni Collette). Sim, ambos com letra maiúscula. Além deles, há outro personagem recorrente nomeado como Zelador (Guy Boyd). Isto é uma pista de que não são personagens que existem na linearidade de nossa história, mas apenas como arquétipos.

A Jovem Mulher, por exemplo, muda várias vezes o relato sobre como os dois se conheceram porque pode representar todas as mulheres que Jake já se relacionou. Ou quis se relacionar. Note que quando ela desce até o porão da casa e coloca roupa na máquina de lavar, são as roupas do zelador que ela vê ali. Ou seja, ele usa aquela máquina assim como vive na mesma casa.

A mãe e o pai surgem em diferentes momentos de suas vidas, ao mesmo tempo. Desde o período da infância de Jake até o final da vida de cada um. Na verdade, se Jake é o velho Zelador, ambos já estão mortos há muito tempo. E existem apenas em lembranças onde a figura paterna tem uma relação distante – quando se vêem pela primeira vez, o pai aperta a mão de Jake sem sequer olhá-lo – e a materna é a única pessoa no mundo capaz de aceita-lo. Até por isso, talvez seja aquela com quem a Jovem Mulher tem uma relação mais tensa. Afinal, nem mesmo em sua imaginação Jake concebeu alguém capaz de aceitá-lo da mesma forma que sua mãe e teme o tempo todo que ela o deixe. A musa do personagem é, ao mesmo tempo, sua namorada imaginária e uma relação fadada ao fracasso. Por isso, ela tem tantos nomes: Lucy, Lucia e nos créditos é apenas… a jovem mulher! Uma mistura de todas as moças que ele gostaria de ter.

Logo, Estou pensando em acabar com tudo é sobre uma figura renegada de uma pequena cidade que busca aceitação. Jake cresce como uma criança com dificuldades de socialização e de educação (“ele ganhou até uma medalhinha”) e que não tem condições de realizar nenhum de seus sonhos. Termina a vida frustrado concretizando tudo que gostaria apenas em sua mente.

Os créditos ainda revelam que na cena do musical há o Jake Dançarino (Ryan Steele) e Zelador Dançarino (Fredrick E. Wodin), que mais uma vez são aspectos de Jake, não personagens completos. A bailarina também é descrita apenas como Jovem Mulher Dançarina. Todos são idealizações de alguém que adora musicais e comédias românticas e que gostaria de viver uma história como aquela. O fato de Jake ver o Zelador nesta idealização como um vilão perigoso revela como ele vê a sua figura que realmente existe. Ele queria ser o herói, não o “vilão” que foi. Possivelmente, estes personagens também giram em um momento onde ele acredita que sua vida poderia ser diferente se ele tivesse sido diferente. O mais importante é entender que a história que assistimos não é a história que aconteceu para o personagem. Por isso, Jake tem nome assim como Yvonne (Colby Minifie), a mocinha da comédia romântica que ele assiste já como Zelador idoso.

Estou pensando em acabar com tudo

A frase-título do filme é repetida várias vezes dando a entender que é apenas o pensamento de uma namorada pensando em terminar um namoro. Mas também pode ser de alguém… Refletindo sobre se suicidar!

É por isso que quando Lucy/ Louisa/ Jovem Mulher recebe ligações “de uma amiga” e ouve a gravação nunca é uma mulhr. É um homem idoso falando que não se sente lúcido… É o próprio Jake conversando com sua fantasia, avisando a respeito de sua angústia. Paralelamente a isso, a mulher tem enorme pressa em sair daquela casa e daquela cidade. Como Jake sempre quis. E jamais conseguiu.

Ao final, Estou pensando em acabar com tudo toma o cuidado de exibir todos os créditos. Mas de forma embaçada, difusa. Os nomes são minúsculos como se fosse necessário… Chegar bem perto para conhecer quem o fez. A cena pós-créditos revela um carro coberto de neve, e uma pequena porção de gelo caindo de um galho. O sol está chegando, mas entendemos que o corpo de Jake está naquele carro congelado. Ele jamais sairá da escola onde foi tão infeliz.

O Porco & Oklahoma

Tanto o porco quanto a citação ao musical Oklahoma são detalhes importantes no filme. Quando o casal chega a casa dos pais, Jake fala sobre porcos que estavam sendo comidos vivos por vermes. Não vemos estes animais, mas a cena é descrita com detalhes que enojam. E o jantar na casa é… Um porco! Aquele mesmo que surge como uma animação-espírito para conduzir Jake para seu descanso final.

Oklahoma é um musical recentemente citado em Watchmen. A Vanity Fair apontou esta dupla citação não como uma coincidência mas como um detalhe importante. O interesse em ir a fundo do típico homem norte-americano do interior. Curiosamente ou não, o musical não faz parte do livro em que o roteiro do filme se adaptou. No musical, o herói Curly confronta Jud Fry pela mocinha Laurey. No filme de Kaufman, os três papéis são aspectos da mesma pessoa e o confronto é no momento em que Jake nota que ele não está destinado a ser como Curly um herói. Ele será eternamente o vilão. O solitário.

Por isso, ao final de seu discurso o personagem canta Lonely Room. Trata-se de uma música de Oklahoma em que Jud canta sobre a fantasia que Laurey termine em seus braços. E não nos de Curly “que acha que é melhor do que eu”. A Vanity Fair lembra ainda que na canção Pore Jud Is Daid, Curly sugere que Jud… Se mate! A cena pode ser feita de forma a ser cômica ou trágica mas o sentido está lá: os “Curlys” do Mundo acham que os “Jud” não têm lugar por aqui. Estou pensando em acabar com tudo mostra que o fã de musicais Jake, infelizmente, passou a concordar com isto.

Confira o trailer do filme:

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