Quadrinhos para ler durante a quarentena

O que ler durante a quarentena? Temos aproveitado para ler mais quadrinhos e baixar a pilha de atrasados. Mas dois deles, lançados, adquiridos e lidos durante a quarentena chamam a atenção justamente pela temática deles ter a ver com o período que estamos vivendo: as Graphics MSP do Cascão (Temporal) e a do Penadinho (Lar).

++ Até o Cascão lava as mãos contra o coronavírus. E você?

Para quem ainda não conhece, Graphics MSP é um dos melhores projetos editoriais de quadrinhos dos últimos anos, que já ate virou filme. Depois de 150 artistas (quadrinistas e ilustradores) mostrarem suas versões dos personagens de Mauricio de Sousa na série de três álbuns Mauricio+50, Sidney Gusman, idealizador dessas homenagens ao Mauricio e editor-chefe do estúdio do pai da Mônica, propôs que artistas fossem convidados para fazerem suas versões em álbuns dos personagens mais famosos do Brasil. O Mauricio topou e já estamos com 27 álbuns dessa coleção lançados e continuamos contando.

Coincidentemente, as duas últimas Graphics lançadas – a primeira estrelada pelo garoto que não gosta de banho e a segunda da turma do “terrir” do Mauricio – possuem elementos que se relacionam com a pandemia e o fato de ficarmos em casa.

A do Cascão, escrita e desenhada por Camilo Solano (que era um autor que só conhecia de ouvir falar e, agora, já quero ler mais coisas dele e essa é uma das maiores sacadas do projeto Graphic MSP: o de conhecermos outros artistas), nos mostra o Cascão tendo que passar um fim de semana na casa de mais um tio muito estranho e que ele não gosta muito, pois os pais vão viajar. Aliás, o Cascão tem um histórico de tios estranhos. Um irmão do pai dele é o conhecido vilão das histórias da turma da Mônica chamado Capitão Feio. Mas nada supera o tio Gerson que dá ao Cascão os presentes mais bizarros como patinho de borracha pra tomar banho, piscina de plástico e fala tudo em rimas ou com ditados populares.

Para piorar, ele mal chega na casa do tio e desaba um… temporal. A mesma palavra que dá nome ao álbum pode ter dois sentidos: o de bastante tempo ou de uma chuvona. Temporal, temporada é o que estamos tendo em nossas casas há mais de 120 dias. E apenas uma pessoa com a imaginação de uma criança como o Cascão (ah, as histórias dele no lixão fazendo seus brinquedos com tudo o que encontrava por lá…) podem fazer a gente superar ou amenizar esse tempo todo dentro de casa.

Enquanto a do Cascão chegou às bancas e livrarias no início da quarentena, ou seja, em meados de março, inviabilizando inclusive o lançamento presencial com a famosa sessão de autógrafos com o autor, a segunda Graphic estrelando a turma do Penadinho foi lançada há algumas semanas no meio de julho. Assim como a primeira parte da história, lançada em 2015, essa é escrita e desenhada pelo casal Cristina Eiko e Paulo Crumbim, conhecidos pela série chamada Quadrinhos A2, onde contam de forma bem humorada algumas histórias do seu cotidiano.

Nessa segunda Graphic, que se inicia exatamente onde terminou a primeira (o que me fez ter que reler a para relembrar como a história acabava), a turminha do cemitério precisa ajudar a Dona Morte com uma situação e conhecem o escritório dela, em um prédio abandonado no Centro da cidade. Abandonado? Bom, mais ou menos. E é nessa situação que é trazida à tona as várias definições de Lar, como o título do álbum. Lar seria apenas casa? Precisa ser um lugar? Precisa trazer que tipo de sentimentos? Pessoas que já morreram precisam de um lar? Mais uma vez, não tem como não comparar com a situação que estamos vivendo. Famílias que há tempos não ficavam juntas por longos períodos precisando se reacostumar. Pessoas sozinhas que estão impossibilitadas de ter contato com amigos/as, namorados/as, colegas. A ressignificação do conceito de Lar para as pessoas durante a quarentena.

Tem muita gente que ainda tem o preconceito de achar que quadrinhos são para crianças. Mas desde seus primórdios eles tratam de assuntos “de adultos”. As Graphics MSP têm essa característica desde os primeiros números, de serem histórias para todas as idades, onde cada pessoa conseguirá ler camadas diferentes a cada edição. E é um dos motivos de ser um dos melhores projetos com quadrinhos dos últimos tempos: trazer de volta os antigos leitores da Turma da Mônica, vendo seus personagens em outras situações, escritos e desenhados por diversos artistas proeminentes do mercado nacional, mas sem deixar de lado o público original.

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