Conceição atiça em ‘Insubmissas lágrimas de Mulheres’

Não era minha intenção fazer a resenha desse livro para o Desafio Literário do Novembro Negro, havia um outro na fila. Mas, domingo à noite, dia 17 de novembro, fui assistir a uma peça de teatro e voltei com um livro de Conceição Evaristo na bolsa. Me ganhou pelo título, antes mesmo que eu visse quem era a autora, o nome: Insubmissas lágrimas de mulheres, publicado em 2016, pela editora Malê.

O livro me tomou de assalto. É outro livro de contos e traz em cada capítulo o nome de uma mulher que protagoniza a história. Antes mesmo de começar a ler as histórias, me detive na interpretação que Vagner Amaro faz, ainda na orelha do livro, a respeito do livro. Ele vai dizendo que os contos figuram como um terreno de empatia entre mulheres negras e fiquei pensando a respeito da palavra intensa que acentua o título: insubmissa. Essa simples reflexão me tomou por um tempo que poderia durar toda minha vida, lágrimas insubmissas, lágrimas que resistem, lágrimas que reúnem, lágrimas que mobilizam.

Permaneço impressionada com a maneira majestosa que Evaristo tem de nos provocar com histórias que são lindas e nada leves, mas ainda assim gostosas de ler. E lendo, me vejo, vejo todas as mulheres e nossos desafios de sermos quem somos nesse mundo desigual.

Cada conto me atiçou de forma delicada e provocativa a refletir sobre tudo que atravessa a vida das mulheres e sobre nossa diversidade. Mulheres do campo, da cidade, mulheres que vêem com olhos incomuns, lésbicas, casadas, sonhadoras, solteiras, vivendo suas solitudes, mulheres que dançam, jovens, rainhas e todas múltiplas possibilidades relatadas nos contos.

E, além disso, os contos me fizeram pensar nas relações entre homens e mulheres. Evaristo engendra as histórias de modo que deixa visível algumas perguntas sobre os homens, como no conto em que uma mulher encontra seu marido de muitas décadas quase morto na casa de outra mulher e ela lamenta que ele tenha chegado até aquele limite por colocar sua masculinidade diretamente associada a habilidade de manter seu “falo” rígido. Ela mesma, a protagonista, tinha sugerido a seu marido que buscasse outras mulheres quando percebeu que ele já se deprimia ao não conseguir mais transar com ela. E o que isso diz sobre as relações de gênero, sobre os homens, sobre nosso contexto social atravessado por conceituações rígidas a respeito das masculinidades?

Foi de uma maneira delicada, em uma narrativa respeitosa e bela que minhas lágrimas foram se submetendo às emoções suscitadas pela leitura. Chorei com a mulher-menina que pintava com sangue, chorei com a moça que inventou seu próprio nome e reconheceu sua solidão. Chorei com a menina que foi roubada dos pais e quase esqueceu suas origens até que suas raízes a encontraram. Chorei insubmissas lágrimas.

Li em menos de vinte e quatro horas o livro de 140 páginas e corri para escrever aqui. Entre as escritoras negras brasileiras, Evaristo me encanta por sua beleza, pela narrativa delicada, respeitosa e conectada. Lê-la é experimentar um momento em volta da fogueira, pois sua escrevivência toca nesse lugar do que nos é comum, conhecido, partilhado.

Nem preciso dizer que amei Insubmissas lágrimas de Mulheres e só poderia dar nota 10 pra ele, por tudo que me fez sentir.

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