Em sua mais recente temporada, a série Manto e Adaga colocou sua dupla de protagonistas diante de seu maior inimigo: eles mesmos. Talvez a grande pergunta que se queria responder era: estarão os jovens protagonistas prontos para conseguir ser super-heróis? Cada episódio, cada obstáculo e o embate com o vilão da temporada colocava para ambos o dilema entre manter a esperança e seguir em frente ou desistir de tudo.
Sendo uma série voltada para o público juvenil, essas questões e respostas acabam sendo apresentadas de forma bastante didática. Contudo, isso não atrapalha a qualidade do programa, que, além de um roteiro muito bem amarrado, conta com um elenco competente, especialmente os que interpretem os protagonistas.
Os primeiros episódios da temporada colocam Tandy e Tyrone diante de um problema mais imediato: o que fazer com os seus poderes? Eles sabem que precisam usar para algo bom, mas não tem muita noção de como ou mesmo o que fazer. Em paralelo, Tyrone está fugindo da polícia e Tandy tenta se reconectar com sua mãe. Tandy não quer incomodar o seu amigo com maus problemas e Tyrone não quer atrapalhar a companheira nos momentos felizes que vem tendo com sua mãe.
Com isso, Tyrone tenta desmantelar grupos de tráfico de drogas. Tandy, por outro lado, está às voltas com um grupo de apoio a mulheres que sofrem violência doméstica, tentando ajudar com seus poderes algumas dessas mulheres. O resultado disso é basicamente os dois se atrapalharem bastante e não conseguirem resolver nada. Eles não conseguem justamente porque tentam fazer separados, e não combinando seus poderes, força e inteligência.
Os casos vistos por Tandy mostram uma realidade bastante cruel vivenciada por mulheres, com uma forte relação com a realidade vivida em todo o mundo. Como em outras séries realizadas neste momento, Manto e Adaga também se posiciona diante do recrudescimento do assédio e da violência contra as mulheres. O mesmo ocorre, ainda que de forma menos destacada, em torno à questão das drogas, mostrando o impacto do tráfico e do uso na vida das pessoas.
Embora caminhando separados, Tandy e Tyrone no final das contas estão trabalhando em pontas diferentes de um mesmo problema, e é quando descobre-se essa conexão que o expectador é apresentado ao vilão da temporada. Depois de ganhar poderes da mesma forma que os protagonistas, André precisa se alimentar da esperança de outras pessoas, para evitar dores intensas. Para isso, manipula e sequestra mulheres, deixando-as isoladas e sem esperança diante do mundo e, depois, as coloca para se prostituírem. Aqui se coloca uma profunda reflexão sobre uma sociedade que isola, enfraquece e marginaliza mulheres, deixando-as inertes frente aos problemas do mundo, tornando-se objetos masculinos e ficando completamente sem esperanças. Neste ponto da série há um grito de revolta, encarnado principalmente por Tandy.
Tyrone, ainda que não sendo vítima direta do vilão, também acaba sem esperança. Calado pela polícia, acusado de um crime que não cometeu, perdeu o convívio com os amigos e familiares. Estes, diante da investigação que Tyrone realiza, também acabam ficando em perigo. O reencontro com os pais se á em momentos bastante tensos. Para piorar, os segredos que Tandy e Tyrone preferiram não contar um para o outro acabam os afastando, enfraquecendo-os em seus embates.
Claro que, depois de muito sofrimento e desencontros, a dupla de protagonistas não apenas se reconecta, como enfrenta seus próprios medos: o pai abusivo, no caso de Tandy, e ele próprio no caso de Tyrone. Coragem, amizade, verdade, compaixão, esperança – no final das contas Manto e Adaga é um prato cheio de lições de vida, resumindo numa mensagem: precisamos fazer algo para ajudar o mundo, usando o que temos de melhor, e enfrentando desigualdades e injustiças.
Tandy e Tyrone estão prontos para serem heróis? Eles próprios sabem que será difícil, mas também sabem que seria impossível caso não tivessem feito o acerto de contas com seu próprio passado. E sabem que não podem fazer isso sozinhos.
Nota: 8