É bem provável que você conheça a história do acidente aéreo envolvendo o voo 571 da Força Aérea Uruguaiana em 13 de outubro de 1972, que levava o time de rugby Old Christians de Montevidéu a Santiago. Ou levaria, já que devido as péssimas condições climáticas o avião caiu nos inóspitos Andes. É provável também que você tenha assistido ao menos um dos filmes feitos anteriormente sobre o assunto, seja o mexicano Sobreviventes nos Andes (Supervivientes de los Andes) de 1976 ou o hollywoodiano Vivos (Alive) de 1993. Mas no ultimo dia 4 chegou à Netflix o longa A Sociedade da Neve (La Sociedad de la Nieve), de J.A Bayona.
Mesmo sendo uma produção espanhola, e não conterrânea aos envolvidos, A Sociedade da Neve é o mais realista e o que mais respeita aqueles a quem essa história pertence. Uma por ser inspirado no livro homônimo (publicado no Brasil pela Companhia das Letras) de Pablo Vierci, amigo de muitos dos sobreviventes e vítimas do que ficou conhecido como Tragédia dos Andes ou Milagre dos Andes. Outra que Bayona foi o primeiro cineasta a ter contato com os sobreviventes e quis que os atores também o tivessem. E também o primeiro longa em que o elenco é formado por atores uruguaios e argentinos. Atitudes que resultaram em muito mais do que verossimilhança.
Lançado no Festival de Veneza de 2023, o filme de 2h conta com realismo e sensibilidade essa história que ainda traz muita dor aos envolvidos. Das 45 pessoas a bordo 29 sobreviveram a queda, mas nem todos resistiram aos ferimentos, frio, desnutrição e intempéries. Apenas 16 foram resgatados após 72 dias de condições extremas. E só o conseguiram porque, além do trabalho em equipe, tomaram a difícil decisão de consumir a carne dos mortos.
Uma das tantas coisas interessantes nesse acontecimento é que ninguém pode se apropriar dele, ou mesmo querer lhe atribuir um significado. Não existe um porquê, ou lição a ser tomada. Um acidente aconteceu, e pessoas precisaram fazer o necessário para sobreviver. Precisando até mesmo abrir mão de algumas convicções sobre o que era ou não aceitável.
E Bayona teve todos os cuidados para que A Sociedade da Neve fosse o mais respeitoso possível. Além de contar com relatos dos sobreviventes (e até participação de um deles, Carlitos Páez, interpretando o próprio pai), ele tirou as vítimas das sombras listando seus nomes ao longo do filme. A trama chega a incluir narração em off pelo ponto de vista de Numa (Enzo Vogrincic), um dos jovens que faleceu alguns dias antes do resgate devido a uma infecção.
A primeira exibição do filme aconteceu em 1º de setembro numa sessão exclusiva para os sobreviventes, familiares e enlutados. Só podemos imaginar a emoção que foi para eles conferir o trabalho pronto. Daniel Fernández Strauch, um dos sobreviventes, não escondeu a emoção ao lembrar o fato: “O abraço final de todos era como se a cordilheira tivesse vindo para Montevidéu. Estávamos todos lá.”
A Sociedade da Neve concorre como Melhor Filme Internacional no Globo de Ouro 2024, cuja premiação ocorre amanhã (7). E é cotado para concorrer na mesma categoria no Oscar 2024, as indicações serão divulgadas no próximo dia 23. Devido à qualidade e ao respeito pela história, seria muito justo que ganhasse.
Os roteiros são de Bayona, Bernat Vilaplana, Jaime Marques e Nicolás Casariego.
Nota: 10
Confira o trailer:
https://www.youtube.com/watch?v=9cjSePIf1l0?si=DgPyWX6sgnZFAWSQ